quinta-feira, 10 de março de 2011

Imprevisibilidade

Já por várias vezes que referi que o mais previsível na Tailândia é a imprevisibilidade.

De alguma forma isto é um dos elementos que transforma este país, este povo e esta forma de vida numa caixa de surpresas diária e confere algum interesse àqueles que se dedicam a investigar o que por aqui se passa.

Anteontem e ontem referimos a decisão do CAPO de interditar todo e qualquer movimento não autorizado numa larga zona envolvendo a casa do PM Abhisit.

Pois hoje é anunciado que afinal a "No Go Zone" passa a ser uma "Go Zone" só que manifestações ou o uso de altifalantes na zona está proibido.

Felizes os residentes e comerciantes que se manifestaram contra a medida mas atenção que amanhã poderemos ter uma nova reviravolta no processo já que o navio parece ter demasiados comandantes ao leme e cada um pode ter afinal uma nova ideia sobre o rumo a seguir.

Entretanto no Sul tudo como dantes ou seja lá vão sendo colocadas mais umas bombas, morrendo umas pessoas, continuando o clima de medo entre as populações mas isso são pormenores sem grande significado. Uma vez numa visita a Khon Kaen, no nordeste do país, perguntava às pessoas com quem me encontrei a opinião deles sobre a insurreição no Sul do país e as respostas eram sintomáticas. Isso é lá no Sul (como se de outro país se tratasse) e é entre budistas e muçulmanos! Na realidade sendo um assunto que não faz ganhar votos, e as três províncias do Sul onde há confrontos diários há cerca de 7 anos elegem um número reduzido de deputados, não vale a pena o poder nem mesmo as populações não directamente afectadas preocuparem-se, pelo menos assim pensa quem vive ao Norte dessas três províncias!

quarta-feira, 9 de março de 2011

Mai Pen Rai

Ontem referi que a política de concessões e de cedência às manifestações por parte do governo podia criar precedentes complicados de gerir no futuro da mesma forma que será difícil de gerir o constante aumento do deficit orçamental.

A situação neste momento no que respeita manifestações começa a ser um pouco caricata com o aparecimento diário de grupos a protestarem por isto e aquilo.

O uso de direitos democráticos é um direito mas também um dever a quando começa a haver grupos sem ou com limitada representatividade a interferir com o normal funcionamento da sociedade temos que a democracia anarquiza-se para prejuízo de todos.

Os amarelos do PAD, estão aquartelados desde o dia 25 de Janeiro na zona nobre do sector mais antigo da cidade (Rajadamnoen) e embora sejam menos do que 500 ocupam uma parte significativa do local. Já foram intimidados por ordem judicial a "levantar o acampamento", que não obedeceram, já viram por duas vezes a polícia reduzir o espaço onde têm montadas tendas sendo que após a segunda vez o Major General Chamlong de imediato anunciou que iriam recuperar o "terreno perdido" e assim fizeram.

Um pouco mais acima, na parte Leste da Praça Real onde se encontra a estátua a cavalo do Rei Rama V e está o palácio de Ananta Samakhon, um grupo, também de não mais do que umas escassas centenas, da Assembleia dos Pobres está acampado impedindo o acesso ao Parlamento e ao Zoológico. Ali estão calmos e sossegados mas não se percebe bem o motivo a não ser que requerem que o governo os ajude a enfrentar os problemas financeiros em que se envolveram.

Em redor da Government House acampam sub grupos dos amarelos – a seita religiosa Sancti Asoke (tipo budistas radicais) e a Rede dos Patriotas Tailandeses que pedem a dissolução do governo. Também não são mais do que uma ou duas centenas.

Outro grupo que se manifesta no local é o PMOVE, o People Movement for Just Society, que reclama justiça igual para todos. Parece ser eventualmente uma dissidência dos vermelhos da UDD mas não se consegue bem entender já que pouco mais apresentam do que simples cartazes solicitando justiça.

Agora um grupo de residentes e empresários da zona onde vive o PM Abhisit e que se sente extremamente incomodado com o bloqueamento da zona onde vive (extremamente alargada como referi), manifesta-se solicitando a Abhisit que se mude para a residência oficial e deixe funcionar o comércio e que as pessoas possam chegar a suas casa sem problemas. Posso confirmar que a zona se transformou num "inferno" com a presença maciça de militares, arame farpado e armamento, como se de uma guerra se tratasse e é extremamente incomodativa para quem tenha ou queira deslocar-se na ou para a zona. Há pelo menos dois restaurantes na área que eu gosto de frequentar e nem sei se lá posso ir ou mesmo que consiga convencer os militares que montam as barreiras até lá chegar não me apetece dar-me a esse trabalho nem às demoras que isso acarreta.
Mas o problema não é só Bangkok. Há neste momento manifestações, por isto, por aquilo e por coisas que ainda nem sequer estão no pensamento de ninguém em Phitsanulook, Nakhorn Sawan, Angthong, Ayuthaya e eventualmente outros sítios que não conheço. Interessante que nenhuma destas províncias se situa em zonas tidas por serem vermelhas o que quer dizer ou que estes estão mais espalhados do que se sabe ou que muitos outros estão descontente ou a aproveitar-se das políticas "mai pen rai" do governo.

Mai Pen Rai é uma expressão estremamente típica na Tailândia, que inclusive mereceu ser título de um livro com algum interesse para quem queira entender a cultura base urbana do país, e que significa basicamente "não tem importância" de alguma forma associada com "não faz mal", não há problema" ou outras expressões semelhantes.

Quando se abre a porta nunca se sabe quem vem atrás e entra por ela e é isso que está a acontecer com a permissividade mostrada em Government House do que o descrito acima é um simples sinal.
Entretanto no Sul ontem morreram mais duas pessoas, um chefe de uma aldeia e uma criança de 14 meses, vítimas inocentes de uma situação que parece ser menos importante do que a casa do PM em Bangkok.


Ironias e Contradições

Contradições em tempos eleitorais: Por um lado o partido Democrata do PM Abhisit consegue reunir num jantar de colheita de fundos 750 milhões de baht (19 milhões de euros) atraindo inúmeras pessoas e portanto mostrando a sua popularidade o CAPO (Center for the Administration for the Peace and Order) decidiu fechar as ruas numa muito vasta área em redor da casa de Abhisit a todos os veículos não autorizados.

Entretanto o jantar está já a colocar algumas questões pois é obrigatório que as doações aos partidos superiores a 100.000 sejam declaradas á Comissão Nacional de Eleições e até esta manhã ninguém tinha apresentado nenhuma declaração relativa ao jantar de ontem. Fica a assim a dúvida de nesse jantar estariam 7.500 pessoas e todas sem excepção, incluindo Abhisit pagaram 100.000 baht. Lembremo-nos que em dois casos anteriores de doações ao partido no poder não declaradas, uma de 258 milhões da baht e outra de 68 milhões, os tribunais vieram a dar como não procedente um pedido acusando o partido de violação da lei devido a irregularidades nesses processos que assim foram arquivados.

Abhisit e a sua governação são assim fortemente aplaudidas e saudadas ao ponto de conseguir num jantar aquela grande quantia mas tem de viver como um recluso entrincheirado numa zona de exclusão de vários quilómetros quadrados.

Ironias e contradições em tempos eleitorais.

terça-feira, 8 de março de 2011

El Dorado e Inferno

Ontem referi os sinais de que as eleições se aproximam e ontem mesmo o PM antecipando a reunião semanal do gabinete, decidiu a continuação da distribuição de subsídios à esquerda e á direita.

Para manter artificialmente o preço do gasóleo abaixo dos 30 baht (actualmente é 29.99) o governo gastará até ao final de Abril mais 18 mil milhões de baht. No que respeita o preço, também artificial, para o arroz na produção e assim calar aqueles que se estavam a manifestar em Pitsanuilok, 60 mil milhões de baht. Para aumentar os salários dos deputados 13 mil milhões de baht e para manter a electricidade gratuita para aqueles que gastam abaixo de um limite estabelecido 10 mil milhões. Foram estas as decisões do Conselho de Ministros no que respeita benefícios a distribuir. Um total de 101 mil milhões de baht ou seja qualquer coisa como 2,4 mil milhões de Euros só para calar as bocas de alguns.

Rico país que se pode dar a estes luxos nos tempos que correm mas de alguma forma pouco compatível com algumas palavras de precaução há meses lançadas pelo Ministro das Finanças, aquele que tem a chave do cofre e sabe quanto dinheiro lá existe, sobre os perigos dos deficits orçamentais.

Entretanto estas medidas que o PM vem anunciando de alguma forma são elas próprias propícias a que mais e mais sectores da sociedade se manifestem por isto ou por aquilo pois vão ficando a saber que desse modo conseguem os seus objectivos através do largo saco azul da Government House. Hoje por exemplo a Siam Square, o coração da cidade esteve paralisada porque os vendedores se manifestaram contra as politicas da Universidade de Chulalongkorn, senhoria do local, no que respeita a alocação de espaços

Só o problema do Sul parece continuar a não conseguir uma clara atenção de Bangkok e ontem para além de mais alguns mortos, os militantes muçulmanos fizeram explodir um carro bomba (uma novidade que começa a ser recorrente) bem dentro de um dormitório da polícia deixando bem visíveis os danos provocados.

segunda-feira, 7 de março de 2011

As Eleições

Tres anos no poder

As eleições parecem aproximar-se a ritmo rápido não só pelos sinais que são dados diariamente pelo PM Abhisit e pelo seu partido mas também pelo cheiro a campanha que já paira no ar.

O presente parlamento termina o seu termo a 23 de Dezembro e desse modo termina também o mandado do PM mas desde há muito que os vários sectores da oposição reclamam eleições. Um dos argumentos contra este governo é de que atingiu o poder sem que o partido dominante tivesse sido o partido mais votado e desse modo o mandado que o povo deu nas últimas eleições não foi para os Democratas governarem. O facto é que o governo saiu de um processo parlamentar e não é inédito no Mundo, na impossibilidade de o partido mais votado formar governo, de ser o segundo partido a assumir essa função sem que isso lhe retire legitimidade.

De igual forma parte dos sectores próximos do governo, os partidos coligados com os Democratas, sentem que novas eleições lhes podem trazer ganhos em número de deputados e consequente poder, vêm de tempo a tempo também a solicitar a convocação de eleições antes do termo parlamentar.

Abhisit por seu lado sente a pressão a que é submetido diariamente por variados sectores da população descontentes com a sua governação e parece claro a todos que a dissolução do parlamento com a consequente convocação de eleições antecipadas está para breve. O crescente custo de vida, dos preços dos bens essenciais com o arroz à cabeça, a falta ou racionamento de alguns como o óleo alimentar e o açúcar, a ineficácia das politicas de apoio aos menos favorecidos, a iniquidade nas políticas sobre a propriedade, etc., têm criado constantes conflitos na sociedade e hoje em dia acontecem diariamente manifestações por todo o país não relacionadas com aspectos de direitos políticos mas com o descontentamento das sociedades com o seu dia a dia e sobrevivência. Neste momento para além de umas quatro manifestações em Bangkok (a única de sentido político é a dos amarelos do PAD) as províncias de Phitsanulok e Nakhon Sawan, no centro do país, estão paralisadas pelos agricultores pedindo medidas que os protejam dos elevados custos.

Os principais partidos iniciaram não só os preparativos mas também a própria campanha e os programas mais recentes do governo nada mais são do que políticas no sentido de ganhar votos nas zonas menos afectam aos partidos no poder.

Os quatro principais partidos que se apresentarão a eleições anunciaram os seus principais objectivos:

O Pheu Thai, o herdeiro das políticas thaksinistas e o maior partido no país actualmente com 189 deputados, anunciou que o seu programa se centrará no retorno das políticas que utilizou no passado com tanto sucesso. Interessante é que as actuais políticas de Abhisit são no seu essencial uma cópia das políticas usadas pelos antecessores do Pheu Thai (embora sem resultado), algumas inclusive com melhorias, e portanto seria interessante se viessem a formar governo de ver como é que o partido thaksinista se iria sair nesse processo.

Os Democratas, do PM Abhisit, actualmente com 173 deputados, dizem ir focar as suas políticas no aumento dos rendimentos das famílias, políticas que aliás o governo começou a lançar, num sinal de pré campanha por volta de Novembro de 2010.

O Bhumjai Thai, o partido que é uma dissidência do anterior partido thaksinista liderada por Nevin Chidchob, actualmente com 32 deputados tem como objectivo duplicar o número de lugares e afirmar-se como a charneira em qualquer coligação. Este partido domina alguns dos mais importantes ministérios, Interior que controla todo o processo regional, local e eleitoral e os do Comércio e Transportes e Comunicações, ambos dotados de generosos orçamentos, que se diz serem desviados para o benefício de projectos directamente ligados com o ganho de votos. A este partido está fundamentalmente destinada a tarefa de arrebatar votos nas praças-fortes do Pheu Thai fortalecendo a possível coligação com os democratas e enfraquecendo a oposição. É sabido contudo que Nevin não tem problemas nenhuns em se encostar ao seu anterior partido se para isso for convidado. O objectivo é claramente manter-se no poder sem ter o peso de estar no comando.


O Chart Thai Pattana de Banharn Silpa-archa, o todo poderoso senhor de Suphan Buri uma província ao Norte de Bangkok, veterano da política e antigo PM, actualmente com 31 deputados é de alguma forma semelhante ao Bhumjai Thai, não só nas sua anterior coligação com os thaksinistas, mas por ser um partido também incontornável na formação de um governo no país e assim quererá manter-se. O tema principal da campanha do velho leão, já com 78 anos, será a reconciliação. Banharn conseguiu ser aliado de uns sem se antagonizar com os outros um pouco ao contrário de Nevin que é visto elo campo do Pheu Thai como um traidor, embora se saiba o pouco valor que isso tem em política.

A campanha está aberta e tudo aponta para que o PM Abhisit possa dissolver o parlamento ainda este mês ou no início de Abril processando-se o acto eleitoral nos finais de Maio inícios de Junho. Com uma pontinha de orgulho pessoal posso dizer que no início de Outubro produzi um "paper" onde traçava o calendário político futuro e todos os acontecimentos até agora vieram mostrar que acertei a 100%. Espero que assim seja também nas eleições pois as datas que acima mencionei são as que estão escritas nesse documento.

Entretanto Abhisit que iniciou de forma clara a sua campanha eleitoral já há semanas vai ter uma dura tarefa pois mesmo em Bangkok, um dos supostos bastiões dos Democratas, tem vindo a ser incomodado cada vez que aparece. Na semana passada foi no mercado de Jatujak, onde foi apupado e perseguido e ontem foi numa conferência na Universidade de Thammasat onde, enquanto falava, da assistência foram levantados cartazes dizendo "só sabes é falar" e "mãos cheias de sangue", referindo-se porventura ao facto de muitos entenderam que o PM acaba por ter um poder limitado aos seus discursos e acusando-o das consequências dos sangrentos acontecimentos de Abril-Maio de 2010.