A clareza e transparência do sistema de justiça são, no meu entender, um dos mais importantes factores capazes de suportar um estado que quer viver um verdadeiro sistema democrático.
Por norma discute-se e manifesta-se contra a (falta de) qualidade dos sistemas de educação e de saúde, de facto dois sistemas fundamentais para a criação de uma sociedade sã e desenvolvida, mas sem um sistema que saiba aplicar a justiça com rectidão, a tempo e sem olhar a nomes ou meios, poucos objectivos se conseguem atingir já que acabamos sempre por ver a justiça ser usada a favor de interesses próprios por norma contra os interesses comuns.
Assim se passa infelizmente em muitos países no Mundo e uma má justiça está sempre associada à fragilidade do sistema político à corrupção dos políticos e de todos os que têm por obrigação servir o interesse público.
Assim se passa ali e assim se passa aqui.
Na Ásia para acrescer ao que disse há o factor sempre interveniente da necessidade de encontrar compromissos para que "ninguém sinta a perda da face". Por norma, e sempre que está envolvido alguém com alguma visibilidade pública, com poder ou simplesmente com meios financeiros, há que encontrar uma forma para que aquele que porventura possa ser acusado de algo de mal ter feito consiga escapar a "infâmia" de uma condenação.
A Tailândia não é excepção.
Desde os casos do "menino de ditas boas famílias" que atropela com o seu Porsche uma pobre rapariga e a mata ou deixa inválida, aos membros das forças de segurança que deixam funcionar estabelecimentos sem as menores condições de segurança onde depois há acidentes e morrem dezenas de pessoas, aos acontecimentos mais politizados como a morte por falta de ar de dezenas de muçulmanos transportados como gado em camiões militares, ao sequestro e desaparecimento forçado de activistas pelos direitos humanos (por todos vistos e conhecidos os autores) que nunca são resolvidos por "falta de evidências" até à eterna saga dos casos envolvendo políticos que nunca chegam a ser decididos, nenhum caso chega a ser decidido e os culpados acusados.
Como se costuma dizer em Portugal a culpa "morre sempre solteira" e nunca encontra alguém para emparelhar.
Um dia em conversa com um General da Polícia dizia-me ele que aqui ninguém queria estar na área da investigação por duas razões fundamentais. Primeiro porque o salário, já de si baixo, era inferior à maioria dos outros sectores na corporação e segundo porque as pressões era tantas e de tal forma violentas que ninguém queria avançar com nenhum caso para não vir a sofrer ele/ela mesmo algum percalço, seja físico seja de carreira, no futuro. Desse modo o sector de investigação está fortemente enfraquecido em termos de efectivos e os que lá estão têm que seguir a regra de "não incomodar o chefe".
Esta expressão faz-me lembrar um acontecimento no ano passado e durante as manifestações dos camisas-vermelhos quando uma delegação deles decidiu dirigir-se ao nosso escritório para apresentar um protesto. A polícia compareceu em força (mais de 200 homens fortemente armados no local) e eu tive de negociar a situação com os "vermelhos". Uma das questões que se colocava era saber se a polícia ia ou não prender os líderes que para lá se dirigiam pois vários estava já acusados de "terrorismo". Tudo acabou por ser passar muito pacificamente pois não era essa a missão da polícia. A missão era "não incomodar o chefe". O que se requeria era que os "vermelhos" chegassem, entregassem os documentos que quisessem, falassem para as televisões para a propaganda deles e saíssem suavemente sem que houvesse o menor problema. Assim o chefe não seria incomodado com qualquer notícia nos jornais menos agradável!
A falta de aplicação da lei ou a sua aplicação ao sabor do vento volta a estar em foco.
Desde que o governo pró Thaksin chegou ao poder várias foram as decisões judiciais que estava em "andamento" que foram decididas e, espante-se, a favor do fugitivo ex PM e família.
A condenação da sua ex mulher, em 2008, a três anos de cadeia por evasão fiscal viu o apelo entretanto interposto ser decidido a favor de Potjaman que assim foi ilibada
As eventuais queixas contra os seus filhos, também por evasão fiscal, e que estavam pendentes no Ministério das Finanças há cerca de 3 anos foram despachadas favoravelmente àqueles "visto não serem os legítimos proprietários dos bens" já que numa sentença de 2009 ficou provado que Thaksin transferiu os seus bens para eles somente para iludir o fisco. Conclusão eles não sendo os legítimos proprietários (!!) não têm de pagar impostos e como não há caso contra Thaksin por fuga aos impostos (ao fim de 5 anos o sistema não condenou o ex PM a mais do que "conflito de interesses") não há caso contra ninguém.
Também a famosa petição para amnistiar Thaksin apresentada ao Rei em 2009, da qual quase todos já se tinham esquecido pois o Ministério da Justiça tinha metido o processo na gaveta o que também está errado, acabou por reaparecer e o secretário-geral do ministério, o mesmo de dantes pois não foi mudado, anunciou que o processo de revisão dos milhões de assinaturas está concluído e que existem mais de 2 milhões que são válidas e portanto o processo está pronto para ser enviado para consideração superior.
Em 19 de Setembro de 2006 a noite em Bangkok acordou com um golpe de estado dito ter sido feito para acabar com o sistema corrupto do então PM Thaksin. Durante um ano esteve no poder um governo de iniciativa dos militares golpistas governo constituído para "devolver dignidade ao sistema político" e democracia ao povo. Foram nomeados novos membros de confiança dos agentes golpistas em todas as agências fiscalizadoras do bom funcionamento das instituições garantes da clareza do estado e todos os tribunais de última instância. Houve eleições, três primeiros ministro se seguiram, muitos meses se passaram e o país acabou caindo fortemente em todas as listas mundiais que classificam os países no que respeita a corrupção a transparência e a boa governação e também no sector dos direitos humanos.
Novas eleições ocorreram recentemente, sempre com o apoio e entusiasmo daqueles que querem ver o país progredir no sentido da democracia e no sentido de um sistema de governo onde os valores da justiça, liberdade, verdade, transparência, etc prevaleçam. Mas não tudo continua na mesma como sempre tem sido na história moderna tailandesa.
Até quando?
Por norma discute-se e manifesta-se contra a (falta de) qualidade dos sistemas de educação e de saúde, de facto dois sistemas fundamentais para a criação de uma sociedade sã e desenvolvida, mas sem um sistema que saiba aplicar a justiça com rectidão, a tempo e sem olhar a nomes ou meios, poucos objectivos se conseguem atingir já que acabamos sempre por ver a justiça ser usada a favor de interesses próprios por norma contra os interesses comuns.
Assim se passa infelizmente em muitos países no Mundo e uma má justiça está sempre associada à fragilidade do sistema político à corrupção dos políticos e de todos os que têm por obrigação servir o interesse público.
Assim se passa ali e assim se passa aqui.
Na Ásia para acrescer ao que disse há o factor sempre interveniente da necessidade de encontrar compromissos para que "ninguém sinta a perda da face". Por norma, e sempre que está envolvido alguém com alguma visibilidade pública, com poder ou simplesmente com meios financeiros, há que encontrar uma forma para que aquele que porventura possa ser acusado de algo de mal ter feito consiga escapar a "infâmia" de uma condenação.
A Tailândia não é excepção.
Desde os casos do "menino de ditas boas famílias" que atropela com o seu Porsche uma pobre rapariga e a mata ou deixa inválida, aos membros das forças de segurança que deixam funcionar estabelecimentos sem as menores condições de segurança onde depois há acidentes e morrem dezenas de pessoas, aos acontecimentos mais politizados como a morte por falta de ar de dezenas de muçulmanos transportados como gado em camiões militares, ao sequestro e desaparecimento forçado de activistas pelos direitos humanos (por todos vistos e conhecidos os autores) que nunca são resolvidos por "falta de evidências" até à eterna saga dos casos envolvendo políticos que nunca chegam a ser decididos, nenhum caso chega a ser decidido e os culpados acusados.
Como se costuma dizer em Portugal a culpa "morre sempre solteira" e nunca encontra alguém para emparelhar.
Um dia em conversa com um General da Polícia dizia-me ele que aqui ninguém queria estar na área da investigação por duas razões fundamentais. Primeiro porque o salário, já de si baixo, era inferior à maioria dos outros sectores na corporação e segundo porque as pressões era tantas e de tal forma violentas que ninguém queria avançar com nenhum caso para não vir a sofrer ele/ela mesmo algum percalço, seja físico seja de carreira, no futuro. Desse modo o sector de investigação está fortemente enfraquecido em termos de efectivos e os que lá estão têm que seguir a regra de "não incomodar o chefe".
Esta expressão faz-me lembrar um acontecimento no ano passado e durante as manifestações dos camisas-vermelhos quando uma delegação deles decidiu dirigir-se ao nosso escritório para apresentar um protesto. A polícia compareceu em força (mais de 200 homens fortemente armados no local) e eu tive de negociar a situação com os "vermelhos". Uma das questões que se colocava era saber se a polícia ia ou não prender os líderes que para lá se dirigiam pois vários estava já acusados de "terrorismo". Tudo acabou por ser passar muito pacificamente pois não era essa a missão da polícia. A missão era "não incomodar o chefe". O que se requeria era que os "vermelhos" chegassem, entregassem os documentos que quisessem, falassem para as televisões para a propaganda deles e saíssem suavemente sem que houvesse o menor problema. Assim o chefe não seria incomodado com qualquer notícia nos jornais menos agradável!
A falta de aplicação da lei ou a sua aplicação ao sabor do vento volta a estar em foco.
Desde que o governo pró Thaksin chegou ao poder várias foram as decisões judiciais que estava em "andamento" que foram decididas e, espante-se, a favor do fugitivo ex PM e família.
A condenação da sua ex mulher, em 2008, a três anos de cadeia por evasão fiscal viu o apelo entretanto interposto ser decidido a favor de Potjaman que assim foi ilibada
As eventuais queixas contra os seus filhos, também por evasão fiscal, e que estavam pendentes no Ministério das Finanças há cerca de 3 anos foram despachadas favoravelmente àqueles "visto não serem os legítimos proprietários dos bens" já que numa sentença de 2009 ficou provado que Thaksin transferiu os seus bens para eles somente para iludir o fisco. Conclusão eles não sendo os legítimos proprietários (!!) não têm de pagar impostos e como não há caso contra Thaksin por fuga aos impostos (ao fim de 5 anos o sistema não condenou o ex PM a mais do que "conflito de interesses") não há caso contra ninguém.
Também a famosa petição para amnistiar Thaksin apresentada ao Rei em 2009, da qual quase todos já se tinham esquecido pois o Ministério da Justiça tinha metido o processo na gaveta o que também está errado, acabou por reaparecer e o secretário-geral do ministério, o mesmo de dantes pois não foi mudado, anunciou que o processo de revisão dos milhões de assinaturas está concluído e que existem mais de 2 milhões que são válidas e portanto o processo está pronto para ser enviado para consideração superior.
Em 19 de Setembro de 2006 a noite em Bangkok acordou com um golpe de estado dito ter sido feito para acabar com o sistema corrupto do então PM Thaksin. Durante um ano esteve no poder um governo de iniciativa dos militares golpistas governo constituído para "devolver dignidade ao sistema político" e democracia ao povo. Foram nomeados novos membros de confiança dos agentes golpistas em todas as agências fiscalizadoras do bom funcionamento das instituições garantes da clareza do estado e todos os tribunais de última instância. Houve eleições, três primeiros ministro se seguiram, muitos meses se passaram e o país acabou caindo fortemente em todas as listas mundiais que classificam os países no que respeita a corrupção a transparência e a boa governação e também no sector dos direitos humanos.
Novas eleições ocorreram recentemente, sempre com o apoio e entusiasmo daqueles que querem ver o país progredir no sentido da democracia e no sentido de um sistema de governo onde os valores da justiça, liberdade, verdade, transparência, etc prevaleçam. Mas não tudo continua na mesma como sempre tem sido na história moderna tailandesa.
Até quando?
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