segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Justiça e Desilusão


Justiça, Desenvolvimento e Democracia são conceitos permanentemente associados e interligados. Não é concebível haver Democracia sem direitos e liberdades essenciais, sem mútuo respeito, sem a liberdade de cada um ser diferente mas responsável, livre e capaz de poder exprimir as suas opiniões dentro do respeito da lei e da dignidade e respeitabilidade dos outros.

O abuso destes princípios tem de ser punido devidamente e na justa medida por um sistema judicial em que as pessoas possam acreditar e no qual vejam reflectidas as suas necessidades de protecção contra uma sociedade sempre e cada vez mais ameaçadora como é a que passivamente vamos construindo pelo Mundo fora.

Também não há Democracia sem Desenvolvimento. A desigualdade não pode trazer unidade e a capacidade de todos poderem aceder aos seus sonhos de vida. O Desenvolvimento, infelizmente, muitas das vezes é ele próprio a fonte de maior desigualdade e de grandes injustiças sociais. O balanço que a Justiça deve saber exercer também aí é fundamental para que o Desenvolvimento seja sustentado e chegue a todos independentemente da sua origem social, condição, religião, cor de pele e orientação sexual.

A Tailândia é um país cujo povo acredita fundamentalmente nestes princípios como o demonstram muitos dos estudos sociológicos feitos e muitos dos inquéritos de opinião. A Democracia está no coração dos tailandeses, à sua maneira, como deve ser em cada um dos cantos do Mundo observando-se os diferentes valores culturais.

Apesar disso a Justiça tailandesa “deixa descalços” a maioria do seu povo de tão controversa e “cega” que chega a ser com as suas decisões em nada, mesmo nada, ajudando à consolidação de um estado de Direito e de respeito pelos direitos humanos.

Já várias vezes referi casos de justiça controversos. Aqui mais alguns exemplos recentes, a maioria deles no sector político, ou não seja este o que mais casos leva a Tribunal com a fragilidade quer do sistema quer das leis vigentes: Samak, o ex PM deveria estar na cadeia, visto a condenação a que foi sujeito, de 2 anos de prisão efectiva, em 21 de Outubro de 2008 não tinha apelo; Pojaman ex-Shinawatra, foi condenada a 2 anos de prisão, fugiu do país, regressou e vive descansada na sua casa em Thomburi; Thaksin foi condenado a 3 anos por “conflito de interesses” visto ter dado o seu cartão de identidade (cópia da sentença) para que a sua mulher comprasse uma parcela de terra supostamente de uma entidade controlada pelo Governo, facto do qual ela foi absolvida; Thaksin fugiu do país para não cumprir esses dois anos e é constantemente reclamada a extradição dele, se bem que só para “inglês ver” já que nunca foi iniciado nenhum processo de extradição (por demais impossível perante a fragilidade da condenação); Victor Bount, um traficante de armas Russo é preso em Bangkok, requerida a sua extradição pelos EEUU devido a estar indiciado de crimes de tráfico ilícito de armas e drogas naquela país e tal é negado pelos tribunais tailandeses; três activistas manifestam-se em Chiang Rai contra a política sobre o arroz do governo, bloqueando por duas horas uma estrada e estão desde então encarcerados; milhares de pessoas destroem grande parte da sede do Governo, bloqueiam durante uma semana os dois aeroportos da capital causando mais de 3 mil milhões de euros de prejuízo e nada lhes acontece; deputados de um partido são acusados de ter viciado as eleições e são destituídos; Deputados do partido oposto têm os seus julgamentos adiados desde há mais de ano e meio; atentam contra a vida de Sondhi L., a polícia vem dizer que numa semana sabe-se quem o fez, existem acusações contra altas patentes militares e o caso está esquecido; o Santika arde na noite de Ano Novo, morrem mais de 70 pessoas, diz-se que um dos accionistas é um importante membro da polícia (inquérito do Ministério da Justiça), nada aconteceu a não ser acusar o cantor da banda que estava a actuar e o guarda do parque de automóveis que legalmente é o gerente do clube; as investigações sobre os acontecimentos do dia 7 de Outubro passado não avançam ou melhor é anunciada a decisão e depois adiada sem motivo; a decisão sobre a utilização irregular de 265 milhões de bath pelo partido no poder já foi adiada quatro vezes pois existe sempre um dos juízes que está ausente ou no estrangeiro em missão ou doente; o antigo chefe da polícia anda a ser procurado para ser notificado por construção ilegal numa zona protegida mas não o encontram e o oficial (também da policia) que o foi notificar da última vez afirmou que podia ser emitido um mandado de captura mas não o fazia devido o general ser mais sénior; semelhante caso existe contra o antigo PM, pós golpe de 2006, do qual há um relatório do Ministério do Ambiente dizendo que o local onde ele tem a casa é área protegida, mas nada aconteceu até aqui e duvida-se que tal venha a produzir algum resultado, etc, etc, etc.

Os casos apontados são só meros exemplos de centenas, verdadeiramente centenas, de outros onde não existem decisões ou elas são feitas tendo em atenção o dinheiro do arguido, a sua condição social ou ainda a cor política de que se veste.

Se o país não conseguir evoluir neste particular a Justiça deixa de ser um benefício de todos, essencialmente dos mais desprotegidos, para ser uma arma dos mais fortes daqueles que estão no controlo do poder, tenha ele a forma que tiver e o país recuará em todos os aspectos.

Para uma economia tão carente do investimento estrangeiro (mais de 70% do sector industrial vive de investimento proveniente do estrangeiro) o facto de a Justiça ter uma aplicação deficiente das leis é um tremendo problema sabido como é a dificuldade existente em fazer cumprir contractos livremente assinados por duas partes. Os contratos são em muito casos simples papeis a que uma das partes não atribuiu qualquer valor visto saber que se litigar vai conseguir ganhar benefício junto da instituição Justiça.

Dizia-me outro dia um Inglês que vive à 37 anos neste país, sócio de uma das maiores firmas de advogados em Bangkok que tiveram de sair do escritório onde estavam vistos o senhorio (das mais respeitadas instituição no país), ter requerido a propriedade para construir um condomínio. Passados 10 anos a casa está na mesma e desde o primeiro dia alugada a outros. Óbvio que o dono a isso tem direito. É um facto mas a ética nos negócios, como em tudo na vida, só dignifica.

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